Se você nunca teve algum dos seus direitos trabalhistas desrespeitado, certamente conhece alguém que já enfrentou alguma prática ilegal no trabalho.
Em 2019, o Brasil passou a fazer parte de um relatório bem indesejável. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) incluiu o país na lista suja de nações que mais desrespeitam direitos trabalhistas – muito por conta, segundo o órgão, da Reforma Trabalhista de 2017, que até hoje divide opiniões de trabalhadores, especialistas jurídicos e gestores empresariais.
Além disso, segundo a Justiça de Trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), somente em 2022 o Brasil teve 3,16 milhões de processos trabalhistas ajuizados.
A fim de alertar os trabalhadores e também os RHs sobre possíveis irregularidades, separamos alguns dos direitos do trabalhador que mais são violados nas organizações. Confira:
Demissão após a licença-maternidade
De acordo com um estudo realizado no ano passado, 56,4% das mulheres já foram demitidas após retornar da licença-maternidade ou conhecem alguma profissional que passou por isso. O dado da pesquisa, feita pelo Empregos.com.br, revela, ainda, que somente 5,5% das entrevistadas conseguiram uma promoção durante ou após a gravidez.
Por mais que a ação possa impactar negativamente a reputação das marcas, ela não é ilegal desde que alguns pontos sejam levados em consideração. As mães têm estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Ou seja, uma vez que a licença-maternidade comumente dura 120 dias, o equivalente a quatro meses – desde que a empresa não tenha aderido ao Programa Empresa Cidadã, o que estende a licença para 180 dias –, a profissional não pode ser dispensada nos 30 dias seguintes ao seu retorno. Portanto, demitir uma mulher trabalhadora imediatamente após o retorno ao trabalho configura-se como ação ilegal.
Além disso, os direitos da mãe trabalhadora se estendem ao período de amamentação, como explica Sílvia Araújo, sócia trabalhista da área trabalhista do Veirano Advogados. Segundo a especialista, as mães têm o direito à amamentação até a criança completar 6 meses de idade, podendo utilizar de dois descansos especiais de meia hora cada. Se a empresa possuir pelo menos 30 mulheres profissionais com 16 anos ou mais, é obrigatório um espaço interno para deixar os filhos de 0 a 6 meses ou o pagamento do auxílio-creche.
As regras acima valem para trabalhadoras CLT, mas nos casos de empregadas “PJ/MEI”, os direitos também existem se houver vínculo empregatício ou até mesmo fraude na relação de trabalho. Se preenchidos os critérios de subordinação, onerosidade, pessoalidade e habitualidade, as mães podem pedir o reconhecimento de vínculo na justiça.
O famoso “PJ fixo”
Muitas pessoas ainda não sabem, mas as contratações PJ devem conter documentação oficial, com regras a serem cumpridas de acordo com o regime jurídico da sua empresa.
Segundo um estudo da FGV Direito SP, 64% das reclamações trabalhistas que o STF julgou entre janeiro e agosto de 2023 foram de relações de terceirização ou pejotização – termo utilizado para abordar casos ilegais de relações trabalhistas entre empregados e PJs. Vale destacar que o trabalhador PJ não pode ser submetido a:
Subordinação hierárquica: o trabalhador PJ/MEI não deve estar sujeito a ordens diretas ou controle de horários. Do mesmo modo, não deve ser inserido na estrutura hierárquica da empresa contratante.
Pessoalidade: O profissional PJ tem a liberdade de designar um membro da sua equipe – caso haja – para realizar os serviços contratados, desde que atenda aos requisitos do documento. A empresa contratante não deve exigir que o serviço seja prestado exclusivamente por uma pessoa específica, como ocorre na CLT.
Habitualidade: O PJ até pode prestar serviços regularmente para a mesma empresa, mas isso não deve se caracterizar como uma continuidade típica de uma relação CLT. A prestação de serviços deve ser de forma pontual, por projetos ou contratos com prazos determinados, e não de forma contínua e indefinida.
Onerosidade: No sentido de pagamento de salário, benefícios e direitos típicos da CLT (13º salário, férias, FGTS, etc.), o trabalhador PJ não deve receber remuneração de forma semelhante a um empregado CLT. A compensação financeira deve ser feita de acordo com os termos contratuais entre as empresas, e não como um salário mensal fixo.
Exclusividade: A empresa contratante de um profissional PJ não pode exigir que ele atue de forma exclusiva para ela. A exceção se dá a casos estipulados em contrato.
“A prática [da contratação de um PJ], quando utilizada para mascarar um vínculo empregatício que deveria ser regido pela CLT, é considerada ilegal e configura fraude”, resume Agatha Otero, advogada no escritório Aparecido Inácio e Pereira Advogados Associados.
Atenção às horas extras
Um dos temas campeões quando o assunto é ação trabalhista. Por mais que alguns gestores incentivem que seus colaboradores adotem uma postura de workaholic, existem regras a serem seguidas.
Primeiramente, é definido como hora extra o período trabalhado que ultrapassa a jornada regular estabelecida. Ela deve ser remunerada com um adicional de no mínimo 50% sobre o valor da hora normal ou de 100% quando realizada aos domingos ou feriados. Caso o empregador opte por não remunerar, há a opção do banco de horas, no qual as horas extras acumuladas devem ser compensadas com folgas dentro do prazo estabelecido pelo tipo de banco de horas adotado (mensal, semestral ou anual).
Um ponto que passa despercebido por muitos colaboradores é que as horas extras não podem ultrapassar as duas horas diárias. Segundo a advogada trabalhista Larissa Silva, existem organizações que proíbem que os trabalhadores assinalem as horas extras realizadas em seus respectivos cartões de ponto. Nestes casos, ela recomenda que o trabalhador se resguarde de outras maneiras.
“Guarde tudo que puder ser usado como documento que comprove as horas extras, como e-mails ou mensagens. Procurar o apoio sindical ou formalizar uma denúncia ao MTE ou a Superintendência Regional do Trabalho é importante, pois pode resultar em fiscalização da empresa”, orienta.
Assédio moral
É muito óbvio dizer que situações de assédio moral, sem qualquer exceção, são ilegais. Os casos de assédio moral, abuso de poder, agressão física e desvios de comportamento no ambiente corporativo foram relatados por 41,64% dos entrevistados no “Estudo 2023 – Canal de Denúncias da IAUDIT Tecnologias”. Mas você sabe identificar o que é, de fato, referente à prática? Vamos entender melhor:
Humilhações repetitivas: uma crítica ou correção isolada pode, a depender do tom, incomodar. Mas a configuração do assédio moral depende de alguns critérios nesses casos, como a presença de uma ofensa ou humilhação. Normalmente, o assédio moral depende de ações constantes, que vão desde comentários ofensivos frequentes até a atribuição de tarefas degradantes.
Isolamento social: se o trabalhador é propositadamente excluído de reuniões, conversas, eventos e afins, ou até mesmo é desprovido da interação com colegas, há um cenário de assédio moral. A recusa de informações importantes e necessárias para o desempenho da função também se enquadra.
Excesso de cobrança: existe uma diferença entre a cobrança por resultados e o excesso. Se há fiscalização exagerada e exigências impossíveis – as famosas metas que não têm como bater, mas que geram críticas quando não são realizadas –, o assédio pode estar configurado.
Ameaças, intimidação e retaliação: você foi rebaixado sem motivo aparente e/ou é ameaçado de demissão repetidamente? Então você pode ser vítima de assédio moral por parte do seu gestor. O mesmo vale para punições injustas ou a forçação para que sejam realizadas atividades que te exponham ao ridículo.
Rodolpho Takahashi, CEO do Grupo IAUDIT, recomenda que as empresas tenham um canal de denúncias eficiente para prevenir casos de assédio: “Os canais de denúncias não são apenas um recurso para as vítimas; eles são uma ferramenta essencial na governança corporativa e na construção de um ambiente de trabalho seguro e respeitoso”.
Fonte: RH Pra Você