Em votação histórica, Senado aprova Reforma Tributária em 1º turno

O Senado aprovou nesta quarta-feira, em primeiro turno, por 53 votos a 24, o texto-base da proposta de Reforma Tributária. A votação em segundo turno ocorre ainda na noite de hoje.

O que diz a reforma:

A Reforma Tributária unifica cinco tributos que hoje incidem sobre o consumo.

Eles serão reunidos no imposto sobre valor agregado (IVA), como acontece na maior parte dos países. Esse IVA será repartido em dois: o imposto federal se chamará Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e vai unificar os tributos PIS, Cofins e IPI.

O imposto estadual vai se chamar Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e vai reunir o ICMS (estadual) e ISS (municipal).

Entre os partidos que tem cargo no governo Lula, o Republicanos orientou não e o PP liberou a bancada. O governo contava com ao menos dois votos dos partidos, do senador Hiran Gonçalves (PP-AM) e e do senador Mecias de Jesus (Republicanos – RR), que acabaram votando contra.

PL, Novo, também orientaram contra. Podemos e PSDB liberaram os senadores. O senador de oposição Styvenson Valentim (PSDB-AC) votou favoravelmente.

Apenas um destaque foi aprovado pelos senadores durante votação em primeiro turno. Em acordo com o relator Eduardo Braga, foi acatada a sugestão do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) para que o Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica do Estado do Amazonas seja estendido para todos os estados da “Amazônia Ocidental” (Acre, Amazonas, Rondônia e Roraima) e do Amapá.

Parlamentares não eleitos e que se dedicam atualmente a consultorias voltaram ao Congresso para participar diretamente das negociações sobre a reforma. Entre eles, Romero Jucá (MDB-RR), Fernando Bezerra Coelho (PE), Silvio Costa (Avante-PE), André Vargas (PR). Jucá e Fernando Bezerra participaram nas discussões na CCJ e no plenário do Senado.

— Quero agradecer a votação histórica, No regime democrático, é a primeira vez que o Senado aprova uma reforma tributária. Quero agradecer a confiança no trabalho que realizamos — disse o relator Eduardo Braga (MDB-AM).

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A aprovação ocorreu em meio a pressões de senadores e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) para o fatiamento da Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Concluída a votação no Senado, o texto volta para a Câmara.

A discussão sobre a necessidade de uma reforma para tornar o sistema de impostos mais simples e mais equilibrado já dura quase 40 anos. É a primeira vez que um texto avança a esse ponto. O atual modelo brasileiro de tributação foi instituído na década de 1960 e sofreu algumas alterações na Constituição de 1988.

Ao longo dos anos, especialistas afirmam que a tributação sobre consumo se tornou disfuncional, complexa e ineficiente, o que tornou o sistema desequilibrado e injusto.

A reforma aprovada pelo Senado agora é discutida pelo Congresso desde 2019, mas avançou neste ano nas duas Casas quando o tema virou prioridade do governo Lula e passou a constar em praticamente todos os discursos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

— Estou extremamente feliz. Preferia um placar mais folgado, mas foi — disse o secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy.

Negociações de última hora

As costuras políticas para aprovação da reforma foram até a última hora. A tropa de choque governista ganhou reforço de dois dos senadores mais influentes da Casa: Davi Alcolumbre (União-AP) e Renan Calheiros (MDB-AL) circularam entre as bancadas na tentativa de convencer mais senadores a entregarem o voto sim. Líderes do governo apostavam num placar entre 50 e 52 votos.

O deputado federal Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator da proposta na Câmara, e o secretário do Ministério da Fazenda Bernard Appy também se uniram aos líderes partidários nas negociações de possíveis alterações do texto junto com o relator no Senado. Appy é o autor da proposta inicial aprovada na Câmara e secretário de Reforma Tributária da Fazenda.

Aguinaldo Ribeiro trabalhou para afinar o texto votado no Senado. O objetivo é que as alterações cheguem minimamente acordadas na Câmara dos Deputados, que precisará analisar novamente a PEC.

Novas exceções

Entre as emendas acatadas também de última hora, Eduardo Braga incluiu mais dois setores dentro das exceções. O setor de eventos fará parte da lista de alíquotas reduzidas em 60%. Braga também colocou uma área do setor de energia dentro dos regimes específicos, chamado de Geração Distribuída. A modalidade dissemina fontes de energia renovável.

Braga também igualou os servidores tributários de União, estados e municípios.

Antes da votação, governadores do Sul e do Sudeste defenderam o adiamento das discussões da Reforma Tributária no Senado. O pedido deles também foi para os parlamentares das suas regiões votarem contra o texto, segundo os governadores Cláudio Castro, do Rio de Janeiro, Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, e Ratinho Júnior, do Paraná. Eles estiveram com o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em Brasília.

Mudanças para garantir votação

Nesta terça-feira, o relator já havia ampliado parte das exceções da proposta, criou o cashback obrigatório no consumo de gás de cozinha para famílias de baixa renda e deixou medicamentos e compra de automóveis por deficientes com alíquota zero.

As exceções fazem parte do custo político da reforma, na visão do governo, que precisava de ao menos 49 votos dos senadores para ser aprovada. Para agradar estados do centro-oeste, Braga voltou atrás e permitiu a criação de nova contribuição sobre produtos primários para abastecer fundos estaduais.

O relator também atendeu o setor automotivo e estendeu isenções fiscais para produção de veículos movidos a etanol ou flex. Além disso, desde a primeira versão do relatório, Braga havia atendido o apelo de associações de profissionais liberais para uma alíquota menor.

— O problema são todas essas exceções na PEC, engessa a reforma e é até ruim para o governo. Se viessem por lei complementar, seria outra história — ressaltou o senador de oposição Hamilton Mourão (Republicanos-RS).

Número elevado de exceções

Nas últimas semanas, Braga ampliou exceções e elevou de R$ 40 bilhões para R$ 60 bilhões o repasse anual que a União (por meio do Fundo de Desenvolvimento Regional) fará aos estados para compensá-los pelo fim da guerra fiscal. Ontem, Braga expandiu ainda mais o escopo das exceções, em uma tentativa de obter apoio.

São alterações com impacto para famílias de baixa renda — com a criação de um cashback (devolução de imposto) na compra do gás de cozinha — para setores econômicos e para estados e municípios. No relatório anterior, Braga já havia deixado obrigatória a devolução de imposto para o consumo de energia elétrica para beneficiários do CadÚnico.

Os novos benefícios divulgados ontem foram para taxistas e para sociedades anônimas de futebol (SAFs), entre outros.

O Ministério da Fazenda estima que o número elevado de regimes especiais pode levar a necessidade de um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) de até 27,5%.

Outras alterações de maior destaque, já descritas em relatório de Eduardo Braga, estão a criação de uma alíquota reduzida em 30% do imposto padrão para profissionais liberais, como médicos, advogados e engenheiros. Braga também instituiu um novo tipo de alíquota para a cesta básica.

Além da alíquota zerada, sugerida pela Câmara dos Deputados, também haverá uma alíquota reduzida em 60% para produtos da chamada “cesta estendida”. A lista detalhada será determinada em lei complementar.

O texto de Braga estabeleceu, por exemplo, novos regimes específicos, que poderão ter alíquotas mais baixas que a padrão: serviços de saneamento e de concessão de rodovias, serviços de telecomunicações, agências de viagens e turismo, transporte coletivo de passageiros intermunicipal e interestadual.

O senador também preservou a alíquota zero na compra de automóveis por pessoas com deficiência ou no espectro autista, bem como por taxistas. Ele também incorporou na alíquota zero a aquisição de medicamentos e dispositivos médicos adquiridos pela Administração Pública e por entidades de assistência social sem fins lucrativos.

Eduardo Braga ainda estendeu a isenção de imposto para indústrias automotivas que invistam em carros movidos a álcool. No texto anterior, ele permitia a concessão de créditos tributários para produção de veículos elétricos. A manutenção será válida para plantas de fábricas aprovadas ou implantadas até dezembro de 2025.

O benefício atende, principalmente, governadores do Nordeste, que fecharam contratos recentemente com indústrias automotivas chinesas.

A nova versão da Reforma Tributária também retoma uma proposta da Câmara dos Deputados, de incluir a possibilidade de criação de uma contribuição dos estados sobre produtos primários, para abastecimento de fundos próprios. Essa contribuição será extinta no final de 2043.

A medida é um aceno aos estados do centro-oeste que se sentiram prejudicados com a divisão do Fundo de Desenvolvimento Regional. Os recursos serão distribuídos com prioridade para estados com menor PIB e maior população.

Prêmio por arrecadação

O relator criou um mecanismo para premiar, com mais receita, estados e municípios que forem mais eficientes e aumentarem a sua arrecadação ao longo do período de transição para o novo sistema tributário.

A intenção é evitar o chamado “efeito carona”, que permitiria aos governos estaduais e municipais manterem patamar de receitas semelhante ao atual, independentemente de esforço para fiscalizar o cumprimento da nova legislação ou do seu desempenho econômico.


Comitê gestor

Eduardo Braga também fez modificações no Conselho Federativo, que passa a se chamar Comitê Gestor. O relator retirou o poder do colegiado de editar normas infralegais em relação à distribuição da arrecadação com o IBS. Mas manteve a competência do órgão de distribuir a arrecadação, interpretar e aplicar os regulamentos que serão definidos em lei complementar, além de efetuar compensações de crédito.

O relator também manteve a composição do comitê com 27 membros, representando cada Estado e o Distrito Federal; e 27 membros, representando o conjunto dos Municípios. As deliberações do Comitê Gestor serão aprovadas se obtiverem a maioria absoluta de seus representantes, sendo que a decisão precisa ser apoiada por estados que representam 50% da população do país.

Trava de alíquota

Eduardo Braga ainda criou uma trava para evitar o aumento da carga tributária no país. Será calculado uma média de arrecadação em relação ao PIB, entre 2012 e 2021. Esse percentual será o limite que União e entes federativos poderá arrecadar, chamado de teto de referência. Caso a carga tributária ultrapasse esse valor, precisará ser obrigatoriamente diminuída.

O valor estipulado será revisto a cada cinco anos, com atualização de novos PIBs anuais. O parecer também estabelece a revisão a cada cinco anos de setores em regimes especiais e beneficiados por alíquotas reduzidas.


Zona Franca de Manaus

Para manter os benefícios da Zona Franca de Manaus, a reforma passa a instituir uma Contribuição sobre Intervenção no Domínio Econômico (Cide), um tipo de imposto, sobre importação, produção ou comercialização de bens industrializados que não sejam produzidos na Zona Franca de Manaus, e estejam entre as categorias também produzidas na região.

Dessa forma, os bens produzidos na área continuariam mais baratos e competitivos. Eduardo Braga é amazonense.

Imposto seletivo

No relatório de Braga, o imposto seletivo (o imposto do pecado) não incidirá sobre as exportações, energia elétrica e telecomunicações. O tributo, porém, poderá incidir sobre armas e munições, exceto quando destinadas à administração pública.

O texto também abre a possibilidade de uma cobrança de 1% de alíquota sobre a extração de recursos naturais não renováveis, como petróleo cru e minérios. A determinação da cobrança, porém, será detalhada em lei complementar, que poderá trazer exceções na incidência.

Com a nova previsão, o combustível fóssil, como gasolina e diesel, poderá ter incidência dupla de imposto seletivo. Isso porque, a PEC também abre brecha para que o imposto seja cobrado para o combustível no final da cadeia.

Fonte: Extra

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