Quiet quitting, segunda-feira mínima e semana de 4 dias: os movimentos do mercado de trabalho

Desde o surgimento do movimento Quiet Quitting (Demissão Silenciosa), que tem como desdobramento o Great Resignation (movimento em que pessoas pedem demissão por não se sentirem conectadas ao negócio), assistimos ao lançamento de muitos outros movimentos envolvendo o mercado de trabalho que sinalizam preocupações acerca da saúde mental dos trabalhadores ou sugestões de como driblar os efeitos causados pelo cenário pandêmico. O que realmente importa?

Conhecemos “bem” as sequelas deixadas pelo período pandêmico. Perdemos pessoas queridas; sentimos a morte de perto e ficamos aterrorizados; tivemos que conviver com os nossos problemas mais profundos; ficamos vulneráveis e mais atentos à importância do equilíbrio entre vida pessoal e profissional. A saúde mental tornou-se protagonista na vida e na carreira.

As organizações passaram por transformações profundas, e isso mudou radicalmente a relação entre empregador e empregado. O modelo de trabalho híbrido foi formalizado no período pós-pandemia; a retenção de talentos ganhou destaque nas práticas de gestão de pessoas; a atração de profissionais qualificados ficou cada vez mais difícil; e a flexibilidade do horário de trabalho, hoje, é determinante para a escolha de profissionais em vagas de emprego.

Desde 2021, várias tendências vêm surgindo, provocando o mercado de trabalho e influenciando o comportamento de profissionais em todo o mundo. Os avanços da IA e as ondas de demissões vêm trazendo vários questionamentos e muitos profissionais estão inseguros. O que fazer para ter uma carreira com significado e ao mesmo tempo conseguirmos equilibrar saúde mental, bem-estar e carreira? Isso é possível?

UM POUCO MAIS SOBRE TENDÊNCIAS…

A semana de quatro dias de trabalho, o projeto “The 4-DayWeek Global”, foi testada no Reino Unido no período de junho a dezembro de 2022 e como resultado 92% das empresas participantes afirmaram que manterão o formato. A proposta é que o funcionário receba 100% do salário, trabalhando 80% do tempo, em troca do compromisso de manter 100% de produtividade (modelo também conhecido como 100-80-100). O último percentual chama a atenção! 100% de produtividade significa cumprir com 100% das demandas com a qualidade desejada.

Alguns números são empolgantes. A média de receita das empresas participantes do projeto “The 4-DayWeek Global” cresceu 35% em comparação com o mesmo período de anos anteriores; 90% dos funcionários afirmaram que desejam continuar com o modelo e, destes, 15% afirmaram que não trocariam esse modelo, mesmo que oferecessem muito dinheiro em outro local com cinco dias de trabalho semanais.

Relacionado à saúde mental e ao bem-estar no trabalho, o experimento apresentou: redução nos níveis de burnout em 71% dos funcionários; 43% apresentaram melhoras na saúde mental e 60% afirmaram que conseguiram manter mais equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal.

Reflexão: será que essa tendência é apropriada para todo e qualquer tipo de organização?

A mais recente tendência é a “segunda-feira mínima” ou bare minimum monday, que viralizou com os vídeos postados no TilTok pela americana Marisa Jo Mayes, que tem aproximadamente 155 mil seguidores. Os vídeos alcançaram a marca de dois milhões de visualizações e trazem a sua rotina após ter adotado a “segunda-feira mínima”. O movimento sugere diminuir o ritmo da segunda, com menos tarefas para fazer, incluindo alguns intervalos para autocuidado. Segundo Marisa, ela adotou esse modelo porque não gostava da sua relação com a segunda-feira. Alguns especialistas se preocupam com esse novo “modismo”. Segundo eles, se os profissionais não tiverem cuidado, podem sobrecarregar os outros dias de trabalho para dar conta das suas demandas.

Reflexão: a relação com segunda-feira pode ser complicada por que estamos estafados? Por que não temos um propósito claro de onde queremos chegar na carreira? Ou?!?

O QUE REALMENTE IMPORTA AGORA?

Estava proferindo uma palestra sobre carreira nesta semana e ao abrir espaço para perguntas, um participante fez a seguinte provocação: “estou trabalhando em uma empresa há mais de cinco anos. Preciso do emprego, mas me sinto oprimido e desmotivado! Não consigo dormir e minha produtividade não é a mesma. Fico no emprego por que preciso ou saio para cuidar da minha saúde física e mental?”

Retruquei perguntando: se você sair, terá condições de se manter pelo menos por três meses ou você tem alguém que possa lhe dar esse apoio? Ele respondeu: “não! Não tenho reserva financeira e não tenho ninguém que possa me dar esse apoio”.

Continuei: “chegamos ao ponto. O equilíbrio é importante nesse tipo de tomada de decisão. Não sei o nível do seu estresse, mas, enquanto está empregado, procure um profissional da área da saúde, um psicólogo; faça pequenas pausas; crie uma reserva de emergência para que possa se preparar para uma possível tomada de decisão. Precisamos pensar mais estrategicamente sobre tudo. São muitas variáveis envolvidas. Sua saúde, que vem em primeiro lugar, seu sustento, pessoas que dependem de você etc. Só você sabe o que é melhor para sua vida e somente você pode fazer algo por isso”.

Este post é um convite ao equilíbrio. As empresas precisam repensar suas práticas de gestão de pessoas e modelos de trabalho; os profissionais precisam repensar o que realmente desejam para as suas carreiras independentemente de modismos; e os líderes precisam atuar como facilitadores de todo esse processo.

O QUE PODEMOS FAZER PARA ALINHAR TUDO ISSO: AS ORGANIZAÇÕES, O NOVO PERFIL DO FUNCIONÁRIO E AS LIDERANÇAS?

EMPRESAS

As organizações precisam estruturar uma área de recursos humanos estratégica para mapear quais destas tendências estão presentes no ambiente organizacional e, assim, estabelecer estratégias que sejam aplicáveis em curto e médio prazo. Se for identificado que, em algumas equipes, as pessoas estão se desligando silenciosamente, por exemplo, isso pode sinalizar que a empresa precisa se aprofundar na avaliação de desempenho de seus líderes e/ou implementar ações que visem apoiar a saúde mental dos funcionários e/ou repensar o seu modelo de trabalho, claro que tendo em vista a natureza do negócio. Outra prática interessante é o benchmarking (processo de busca das melhores práticas de gestão de outras empresas) e a pesquisa interna.

LÍDERES

Hoje não temos mais espaço para “chefes”. Líderes precisam ser empáticos e manter o foco nos resultados almejados pela organização. Para equilibrar flexibilidade e produtividade, crie um ambiente em que os liderados expressem seus medos e angústias sem julgamentos; reavalie a quantidade de reuniões e opte por momentos mais rápidos e objetivos; incentive pequenas pausas durante o expediente de trabalho e as organize levando em consideração a operação da empresa; estude maneiras de redirecionar alguns trabalhos para um período em home office; se possível, incentive os funcionários a usar o tempo integral de férias; e estimule momentos/eventos que foquem o bem-estar e a saúde mental, tais como: palestras, ações (massagens, meditação, etc.), escuta por um psicólogo, entre outros.

PROFISSIONAIS

Fazer uma autoavaliação sincera e olhar cuidadosamente para todas as áreas da vida, é o primeiro passo. Evite terceirizar a responsabilidade pelo sucesso da sua carreira e pelo seu bem-estar. Pergunte a si mesmo se a sua carreira atual é o que você deseja e o que de fato você está fazendo para equilibrar vida pessoal e profissional. Perguntas tais como: estou sobrecarregado por que sou explorado ou por que não sei organizar devidamente a minha rotina e manter a disciplina? Estou desmotivado para a segunda-feira por que não sei lidar com o volume de atividades ou por que não sou motivado com o que faço e não tenho um propósito claro? Não estou dando a devida atenção a minha vida pessoal por que não tenho tempo e o trabalho não deixa ou por que não estou organizando devidamente as prioridades? Ao responder as perguntas, coloque em prática aquilo que depende exclusivamente de você.

Fonte: Diário do Nordeste

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